É fato a ausência de cidadania em todas as dimensões sociais no Brasil, mas no trânsito isso fica mais explícito. Pessoas de todas as idades e classes sociais, quando não expressam relações de poder, conduzem seus veículos com incivilidade tão recorrente que prevalece o absoluto desprezo diante das mais básicas regras de convivência social. E quando chegam os indicadores de acidentes o grito é uníssono:
“Falta educação no trânsito”.
Mas há muita controvérsia quando tratamos o tema “educação para o trânsito”, a começar da expressão, já superada, pois o trânsito é apenas parte do problema, não uma questão isolada no contexto dos deslocamentos humanos, principalmente. Mais correto trabalhar a “educação para a mobilidade segura”, a partir do desejável processo de preparação teórica e prática do motorista, sob a égide do planejamento urbano e da sua formação escolar clássica, que é onde emerge a cidadania.
O fato é que tradicionalmente o poder público, quando lida com o tema, opta por modelos de intervenção bastante discutíveis do ponto de vista das políticas possíveis.
A diversidade de programas, projetos e campanhas, e a desarticulação destes com áreas e organismos afins, revelam o descaso das autoridades com este grave passivo nacional. Geralmente são a resposta protocolar de governos preguiçosos e ineptos, que investem fortunas em agências de publicidade para que estas pensem por eles, cujas peças publicitárias, por vezes inócuas e contraditórias, apresentadas em mídias diversas, pouco colaboram para reverter o quadro – um misto de ingenuidade e incompetência mesmo!
Nesse contexto, o Governo de Goiás inova e sai do trivial inútil ao propor importante iniciativa pedagógica em suas escolas, conforme recomenda o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) por meio da Resolução 265/2007 – o “Roteiro de Didática Aplicada/RODA”. Por meio da Secretaria Estadual de Educação (Seduce), em parceria com o Detran-GO, o projeto goiano propõe desenvolver atividades extracurriculares pelo método transversal para toda a rede estadual de ensino, o que envolve o universo de 600 mil alunos e 17 mil professores.
Este projeto é importante porque, uma vez o aluno participando, automaticamente fica dispensado do curso de formação teórica necessário para submeter-se ao exame escrito de legislação de trânsito no processo inaugural de obtenção da CNH. Ou seja, a atividade substitui 45 horas/aula por três anos de aprendizado contínuo (ensino médio) gratuitamente. Quer dizer: além da economia, vem a qualidade no processo de formação do motorista na obtenção de sua primeira habilitação.
No entanto, após implantar o projeto piloto numa escola estadual de Goiânia, estranhamente o mesmo governo interrompeu o processo de sua própria boa obra retomando assim a recorrente política de nada fazer de útil nesta questão.
Segundo apurado, o projeto foi abortado em virtude de limitações financeiras do Detran, que seria o seu financiador – argumento pouco razoável para um órgão que arrecada anualmente cerca de 1 bilhão de reais e irriga dezenas de outros importantes programas governamentais, mas que em quase nada tangem suas nobres e carentes competências.
É o mesmo que formular a boa política pública (coisa rara neste país), lançá-la como algo inovador e moderno, e depois escondê-la por motivos nada convincentes.