Sobre o prosear com a natureza: “Qual é o problema?”
Por Ailton Krenak
Li uma história de um pesquisador europeu do começo do século XX que estava nos Estados Unidos e chegou a um território dos Hopi. Ele tinha pedido que alguém daquela aldeia facilitasse o encontro dele com uma anciã que ele queria entrevistar.
Quando foi encontrá-la, ela estava parada perto de uma rocha. O pesquisador ficou esperando até que falou: “Ela não vai conversar comigo, não?”. Ao que seu facilitador respondeu: “Ela está conversando com a irmã dela”. “Mas é uma pedra”. E o camarada disse: “Qual é o problema?”.
Tem uma montanha rochosa onde o rio Doce foi atingido pela lama da mineração [da Samarco]. A aldeia Krenak fica na margem esquerda do rio, na direita tem uma serra. Aprendi que aquela serra tem nome – Takukrak – e personalidade.
De manhã cedo, lá do terreiro da aldeia, as pessoas olham pra ela e sabem se o dia vai ser bom ou se é melhor ficar quieto. Quando ela está com uma cara do tipo “não estou para conversa hoje”, as pessoas já ficam atentas.
Quando ela amanhece esplêndida, bonita, com nuvens claras sobrevoando a sua cabeça, toda enfeitada, o pessoal fala: “Pode fazer festa, dançar, pescar, pode fazer o que quiser”.
Ailton Krenak – Líder Indígena. Escritor, em “Ideias para adiar o fim do mundo”. Companhia das Letras, 2019.
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