Saludos, Presidenta Elisa Loncón!
“Este sonho é dos nossos antepassados, este sonho se faz realidade, é possível refundar este Chile, estabelecer uma nova relação entre as nações originárias e todas as nações que conformam este país. ” – Elisa Loncón
Por Zezé Weiss
Um saludo emocionado à líder Mapuche Elisa Loncón e a Isabel Godoy, do povo Colla, as duas mulheres indígenas eleitas para a presidência e vice-presidência da Convenção Constituinte que reescreverá a atual Constituição chilena, imposta no ano de 1980 pelo sangrento ditador Augusto Pinochet, que usurpou o poder no Chile de 1973 a 1990. Após ser redigido, o novo texto irá a plebiscito popular, no ano de 2022.
Eleita com 96 dos 155 votos, Elisa Loncón, de 58 anos, natural de Traiguen, região no sul do Chile, doutora em Linguística e professora na Universidade de Santiago, disse em seu discurso de posse: “Estamos instalando aqui uma forma de ser plural, de ser democráticos e participativos. Portanto, esta convenção vai transformar o Chile em um Chile plurinacional. ” Loncón disse também que a Constituinte que vai transformar o Chile trabalhará para reestabelecer os direitos sociais, respeitar a paridade de gênero e cuidar da Mãe Terra.
A Convenção Constituinte, instalada neste 4 de julho, resultou da gigantesca mobilização popular, que contou com a expressiva participação de mulheres, jovens e indígenas, em novembro de 2019. O processo eleitoral, realizado em 16 de maio de 2021, elegeu 77 mulheres e 78 homens, sendo que 17 cadeiras foram reservadas às comunidades originárias do Chile. Dos 155 membros eleitos da Convenção, a maioria se declara independente, com afinidades à esquerda.
A instalação dos trabalhos da Convenção começou com atraso. Do lado de fora do prédio do Congresso Nacional, a polícia chilena do governo do presidente direitista Sebastián Piñera dispersou com jatos de água e gás lacrimogênio as centenas de manifestantes, a maioria Mapuche, que aguardavam o início das votações.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.
Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.
Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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