“Estacionamento é problema particular. Ruas são para deslocamento de pessoas, não de carros. Administro a cidade para o público”. Com esta postura o prefeito Henrique Peñalosa deflagrou, em 1998, a reforma urbana em Bogotá, na Colômbia.
Economista de formação, o ousado prefeito, recentemente reeleito, implantou o Sistema Transmilênio de transporte público como equipamento indutor da expansão de Bogotá, baseado na integração de ônibus tipo BRT (Bus Rapid Transit) inspirado, pasmem, no que vira em Curitiba, Goiânia e outras poucas cidades da América do Sul.
HISTÓRIA
Até 1998, Bogotá, com 7,2 milhões de habitantes, dispunha de um sistema de transporte de passageiros caótico, a exemplo de dezenas de cidades brasileiras e da América Latina. Ônibus de todos os tipos misturavam-se e competiam com vans, kombis, triciclos, táxis e carros “promovidos” a táxis-lotação. Dezesseis anos depois, Bogotá não é mais a metrópole bagunçada no seu jeito de ir e vir. Democratizou-se o uso dos espaços urbanos, a tecnologia brasileira transformou-se em realidade, e consolidou-se a reforma que melhorou radicalmente a qualidade de vida de seus moradores. Implantaram-se conceitos urbanísticos modernos: corredores exclusivos para ônibus; uso do solo radicalmente controlado; calçadas acessíveis; rebaixamentos padronizados e passarelas seguras; restrição de estacionamentos; construção de espaços de convivência; repaginação de praças; recuperação de espaços degradados; e a rede cicloviária integrada – tudo muito bem planejado e sincronizado à reforma estrutural da política de mobilidade urbana.
CAPACIDADES E CUSTOS AO USUÁRIO
O Transmilênio conta com 84 km de corredores exclusivos e 633 km alimentadores distribuídos por 1.290 ônibus articulados, 518 alimentadores e 114 estações localizadas em nove zonas urbanas. Segundo pesquisas do jornal “El Espectador”, um entre cinco proprietários de automóveis migrou para o Transmilênio nos últimos dez anos por ser a opção mais rápida, segura e barata para se locomover. Com a tarifa integrada equivalente a R$ 2,20 os 1,7 milhões de usuários/dia do sistema transitam por toda a Bogotá de forma nervosa, mas ágil, segura e integrada. Ninguém do povo gasta mais que R$ 90/mês com transporte local (o salário mínimo na Colômbia é equivalente ao brasileiro). Os trabalhadores formais ainda usufruem de auxílio-transporte de R$ 70/mês e não há, por lei, gratuidades de qualquer espécie. Contribui para a acessível tarifa, o baixo custo operacional do sistema, e isso se deve à velocidade operacional dos ônibus (27 km/h) somada ao transporte médio de 5,7 passageiros por quilômetro rodado (IPK).
GANHOS AMBIENTAIS
O Sistema Transmilênio traz no seu bojo vários programas ambientais, dentre eles a recuperação de espaços urbanos, como o “Eixo Ambiental” e o “Espaço San Victorino” – intervenções que devolveram à população importantes ganhos ambientais. Paralelamente, somaram-se políticas de monitoramento de ruídos, controle de opacidades, manejo de águas e resíduos sólidos das garagens. Números confirmam que em Bogotá deixaram de circular cerca de 7.000 veículos/dia, o que significou entre 2001 e 2009 a redução de 1,6 milhões de toneladas de emissão de CO2 lançadas ao ar, representando uma economia próxima de R$ 8 bilhões.
GANHOS NA SEGURANÇA PÚBLICA
O Transmilênio é também reconhecido como equipamento de integração urbana e inclusão social. Nos espaços lindeiros aos principais corredores, a população recebeu maciços investimentos habitacionais. Somente no eixo “Caracas”, a principal reforma do sistema, houve redução de 90% no índice de homicídios entre 2002 e 2010. Com ganhos de tempo os bogotanos evoluem econômica e socialmente. Melhorar e equipar espaços urbanos induz à humanização e ao efetivo controle da cidade, constataram os colombianos. Parte dos ganhos imediatos com segurança está no Centro de Controle Operacional (CCO) do sistema, vez que monitora por câmeras “on line” o movimento de estações de transbordo com a presença de birôs policiais convivendo com a engenharia e a fiscalização. Bogotá integra de forma eficiente políticas de transportes, saúde, educação, meio ambiente e segurança pública.
BICICLETAS PÚBLICAS “BICIBOG”
As bicicletas são queridas em Bogotá. São 420 quilômetros de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas integradas ao Transmilênio. Trata-se de um programa semelhante aos existentes em Paris, Amsterdã, Portland, Copenhague e Roma. Usuários cadastrados descem das estações de transporte e acessam pontos de conexão de bicicletas públicas para completar trajetos. Inicialmente instalada num parque da cidade, o BiciBog transporta 1,4 mil bogotanos/dia. Os ciclistas contam com seis bicicletários, com capacidade de acomodação próxima de 1.500 vagas, e paraciclos disponíveis pelos seis cantos da cidade. “Poucas as vagas”, exclamou o usuário Carlos Moreno quando avaliava o novo programa.
CALÇADAS PADRONIZADAS
As calçadas de Bogotá são responsabilidade do poder público. Padronizadas nas vias arteriais e espaços de convivência públicos elas chamam a atenção por sua dimensão e paginação. Todas possuem equipamentos básicos de acessibilidade com foco para pessoas com deficiência. Curiosamente soerguidas 30cm do leito carroçável das vias e com rampas direcionadas, são vistas nas regiões centrais e periferias como importantes porque evitam carros subirem. Bogotá “comprou” guerra contra os automóveis e motos – é o que se vê.
Estão aí as diferenças, entre lá e cá!